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Claudia Assef

Lollapalooza 2019 lotou público de brindes e ativações de marcas

Claudia Assef

09/04/2019 02h05

Em três dias de festival, o Lollapalooza 2019 levou 246 mil pessoas ao Autódromo de Interlagos, numa das edições com line-up mais morno de sua história, que já dura oito edições em São Paulo – e 20 em sua cidade natal, Chicago. Talvez por "culpa" do proprio festival, que sempre jogou os padrões de headliners e novidades lá nas nuvens, este ano o cardápio musical, ainda que muito plural, não perfilou nomes gigantescos no auge de suas carreiras. Mesmo tendo acertado com shows como o de Kendrick Lamar, talvez o mais forte desta edição, e atendido a fã-clubes ardorosos aqui no Brasil, como os de Sam Smith, Lenny Kravitz, Arctic Monkeys, Kings of Leon e Snow Patrol, o Lollabr ficou longe de anos anteriores em termos de atrações musicais.

No que coube à escalação nacional, houve sim ousadia e vimos nomes como Duda Beat, Luiza Lian, Liniker, Letrux, Carne Doce e o furacão pop Iza brilharem, apesar de praticamente abrirem seus respectivos palcos, tocando em horários com pouco público. Para quem buscava algo mais modernoso ou de vanguarda, os nomes estavam mais escassos; teve St. Vicent, tocando sozinha no melhor estilo guitar hero (mas que falta fez a banda completa!) e a fofa e animada francesa Jain, com seu groove africano. Já no palco eletrônico, o som mirou a molecada mais novinha, com atrações de big room passeando entre trap e pós-EDM sem nada de muito novo no front – até Tiësto teve, pra dar aquele revival do poperô melódico que ele já tocou tanto por aqui.

Fato é que ir ao Lolla é uma experiência muito maior do que apenas ver um punhado de shows. Um festival com essas dimensões, divide opiniões radicalmente. Tem quem ache um perrengue retumbante; tem quem não perca por nada, pouco importando o line-up.

Num evento onde o simples fato de se locomover de um palco ao outro pode levar 20 minutos, cada vez mais fica clara a função social de romper com o casulo da internet – não que as pessoas deixem os celulares em casa ou mesmo no bolso -, de se encontrar, beber, desfilar a melhor roupa e ser a sua versão em carne e osso mais próxima possível daquela que as pessoas conhecem pelo seu Instagram.

A Adidas distribuiu canetas pra galera "grafitar" em seu espaço

Nesse ambiente em que tudo cheira a festa, entram no game as marcas, e sua capacidade de ganharem status de atração em si, de virar aspiração e, mais ainda, símbolos de pertencimento a tribos, essa tag cada vez mais difícil de definir. Já faz alguns anos que o Lollabr vem se aproximando dos grandes festivais do mundo, onde as ativações de marca são atrações à parte. Este ano, não foram poucas as vezes em que vi filas mais assustadoras para entrar numa das casas montadas por patrocinadores do que nos banheiros ou bares.

Entre as atrações dessa gigantesca praça de ativações em que se transformou o Autódromo nesses três dias, havia de tudo; do velho e bom sampling de produtos até experiências mais radicais, como uma enorme roda gigante e um brinquedão daqueles que fazem qualquer hambúrguer recém-ingerido querer dar um mosh na multidão. Algumas sacadas simples e super-úteis, como o cantil de alumínio e o bar gratuito de água potável, bancados por um dos patrocinadores, mostram que um caminhão de dinheiro bem gasto pode sim mudar a experiência de quem está no evento, e de quebra criar um vínculo afetivo, que é o que todo mundo quer no final das contas.

O espaço da Budweiser tinha um estúdio com bandas tocando ao vivo

Outras marcas optaram por ativações mais focadas em conteúdo, caso da cerveja oficial, que montou um estúdio para novas bandas se apresentarem ao vivo. Houve quem investisse em questões bem práticas, como deixar seu tênis limpinho, com cara de novo. Também teve os clássicos cases de aliar photo opportunity (sempre cabe mais uma selfie) com distribuição de petiscos. E até o esperto plano de saúde, que não perdeu a chance de fazer amizade com o público que daqui a alguns anos será seu target.

Sob o mote "play for the bold", Doritos montou duas casas repletas de atividades e photo ops. Foto: Alê Virgilio

Também teve marcas inventando memes, criando tatuagens personalizadas, convidando o público a produzir seu formato de comunicação com os artistas, como por exemplo escrever frases para as bandas usando, no lugar de cartazes, gigantes tortilhas de neoprene.

Lembro quando fui no meu primeiro festival da vida, o Hollywood Rock, em 1988. Eu tinha 12 anos, e achava linda a propaganda da marca de cigarros, totalmente ligada a um lifestyle de esportes, com trilha do Peter Frampton. Com um line-up poderoso (Supertramp, Tina Turner, UB 40, Pretenders, Duran Duran, Simple Minds, Symple Red, entre os gringos, e Titãs, Ira!, Paralamas e Marina representando o Brasil), o Hollywood se manteve como o clássico exemplo de naming rights de festivais no Brasil que perdurou por anos com uma extensa lista (Free Jazz Festival, que depois virou Tim Festival, Nokia Trends, Skol Beats, Motomix etc.) de eventos onde o máximo que havia de interação entre conteúdo e marca era distribuir brindes.

Com o passar dos anos, as logomarcas foram diminuindo de tamanho nos backdrops e sendo substituídas em importância pela criação de um tipo de conteúdo que fosse mais prazeroso de ser consumido do que a visão, por exemplo, de DJs tocando sobre uma gigante lata de cerveja.

Já que vivemos numa era consumista, melhor para público e evento que elas se desdobrem em esforços, criatividade e investimento para trazer diversão, serviço ou aquele brindezinho esperto. Imagina se desse para aprofundar essa relação, e daqui para frente as marcas também deixassem legados sociais pensando em questões como sustentabilidade, meio ambiente, igualdade de gêneros para além das grades dos eventos? Fica essa provocação para 2020, quem sabe.

 

Sobre a autora

Claudia Assef é uma das mais respeitadas especialistas em música do país. É publisher do site “Music Non Stop” e ao lado de Monique Dardenne fundou o “Women's Music Event”, plataforma de conteúdo e eventos que visa aumentar o protagonismo da mulher na indústria da música.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre descobertas musicais, novidades, velharias revisitadas, tendências e o que está rolando na música urbana contemporânea, seja na noite ou nas plataformas de streaming mais próximas de você.

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