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Quando o DJ é acusado de traficante, todos correm perigo

Claudia Assef

01/03/2019 16h46

Não é de hoje que a cena de música eletrônica é atrelada ao consumo de drogas. Me lembro bem de algumas matérias sensacionalistas nos Datenas da vida de uns 15 anos atrás noticiando que "tal DJ é preso com carregamento de droga" etc. E não tô falando só de programas desses que se espremer sai sangue, também jornais dito "sérios" embarcaram nesse tipo de "reportagem" várias vezes.

De um lado, o jornalismo de botequim, que não apura uma informação e já logo incrimina antes de investigar (sendo que nem é o papel do jornalista encontrar um culpado, se fosse, ele se chamaria juiz e não jornalista). Do outro lado da bancada, o DJ, esse alvo fácil numa festa, aquele personagem que todo mundo vê e sabe o nome.

Em muitos casos, o tal "DJ", conforme anunciado pela mídia, nada mais era do que um traficante que, ao ser abordado pela polícia e questionado sobre sua profissão, dizia ser DJ. Fácil falar, qualquer um pode alegar ser DJ, não precisa mostrar diploma nem carteirinha de filiação nem nada. É só escrever numa ficha como profissão que tá tudo certo.

Muitos pontos de injustiça nesse enredo, a começar pela má reputação que a música eletrônica sempre carregou consigo e que, de uns anos pra cá, vem melhorando, graças a figuras midiáticas do bom mocismo, como Alok. Dizer que só se consome droga em festa de música eletrônica é mostrar total ignorância sobre a raça humana. O consumo de alteradores de consciência existe desde que o mundo é mundo e em qualquer lugar. Da festa do peão de boiadeiro até o estádio de futebol, vai ter gente usando drogas, sim!

Esse debate foi reaceso quando, no último dia 18 de fevereiro, o DJ Gabe foi preso durante uma operação da polícia numa boate em Rio das Ostras, interior do Rio de Janeiro. O DJ, um dos mais respeitados da cena de psytrance do Brasil, foi levado sob acusação de tráfico de drogas, algo que certamente não pode ser sentenciado numa batida policial. Quem conhece minimamente a trajetória do DJ sabe que seu sustento vem de apresentações muito bem pagas há anos, não só usando seu nome, mas também com o Wrecked Machines, projeto que teve enorme trajetória de sucesso, inclusive internacionalmente.

Acusar um DJ de traficante é apontar o pilar central de uma cena como culpado de algo que, antes de ser minimamente insinuado, precisa ser investigado. Nesta quinta (28), após ser solto, Gabe publicou um vídeo em que conta que sofreu humilhações e maus tratos na cadeia. Tráfico de drogas é um crime grave, e seus infratores devem ser punidos. Mas acusar alguém que há tantos anos presta serviços à uma cultura que já é tão estereotipada e vista como bagunça, é incitar ainda mais o tom de higienização retrógrada que estamos vivendo. Todo o meu apoio ao Gabe e seus familiares.

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Sobre a autora

Claudia Assef é uma das mais respeitadas especialistas em música do país. É publisher do site “Music Non Stop” e ao lado de Monique Dardenne fundou o “Women's Music Event”, plataforma de conteúdo e eventos que visa aumentar o protagonismo da mulher na indústria da música.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre descobertas musicais, novidades, velharias revisitadas, tendências e o que está rolando na música urbana contemporânea, seja na noite ou nas plataformas de streaming mais próximas de você.

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