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O que o Sónar ensinou para nós, mortais, nesses 25 anos de festival

Claudia Assef

08/06/2018 00h19

Festival de música avançada. Na primeira vez que li esta assinatura do festival espanhol Sónar achei um tanto pretensiosa. Mas, quando comecei a mergulhar no universo dos catalães, na profundidade que eles imprimiam em seus line-ups, logo percebi que o Sónar, desde sua primeira edição, em 1994, entrega exatamente o que promete: trata-se de um festival de música avançada, sim, que na melhor tradução livre significa um desfile de artistas sem rótulos, sem obedecer a regras de tempo, geografia ou espaço, que tenham como premissa básica única e exclusivamente o compromisso com a música em primeiro lugar – depois vêm os outros acessórios, como fotos produzidíssimas no Instagram, roupas da moda, performances bombásticas no palco e por aí vai. Para muito artista (com certeza você consegue listar vários), esses penduricalhos vêm bem antes da música, mas não para o casting que você encontra no Sónar.

Desde o meu primeiro Sónar, em 2003, até a edição de 2018, que se inicia na próxima quinta-feira (14), lá se vão seis coberturas minhas deste festival que se tornou uma parte importante da minha educação musical. Mas, por que voltar tantas vezes para um mesmo evento, você pode se perguntar. Porque, além do clima festivo de Barcelona no verão, adoro o espírito sem preconceitos da direção artística do Sónar.

O fotógrafo Fábio Mergulhão fotografando Jeff Mills para a capa da revista Beatz, que eu editava no início dos anos 2000

Nos palcos do Sónar, tanto faz se quem vai brilhar é um artista pop, como o Gorillaz, um dos headliners deste ano, ou nomes totalmente cabeçudos, como por exemplo a dobradinha de Alva Noto com Ryuichi Sakamoto. O Sónar tem portas abertas para o que eu costumo chamar apenas de "música boa" quando estou conversando com minhas filhas, de 6 e 8 anos respectivamente.

Aí entra uma subjetividade na parada, eu sei. Música boa pra quem, queridinha, segundo qual cartilha? Então, também gosto dessa polêmica frase de adesivo de caminhão e de filósofos da internet segundo a qual "só existem dois tipos de música, a boa e a ruim". Seguindo esse conceito tão amplo quanto polêmico, diria que a curadoria do Sónar preza por música boa e ponto final.

Nesse panelão cabe um pouco de tudo. Foi no Sónar, por exemplo, que o funk carioca ganhou espaço hype na Europa, quando o DJ Marlboro desembarcou por lá, em 2004, botando milhares de gringos pra dançar ao som de Bonde do Tigrão, Malha Funk entre outras pérolas da época. Foi também no Sónar que uma histórica apresentação do grupo Chic (do gênio Nile Rodgers) provocou um novo levante da disco music, isso bem antes de o Daft Punk botar os irresistíveis riffs de guitarra de Rodgers de volta nas rodinhas jovens com o hit Get Lucky.

Minha turma de brasileiros num Sónar Barcelona longínquo (2003 ou 04)

Juntar o novo e com o vintage, sem medo de que esse vintage não esteja nem um pouco na moda. Essa tem sido a tônica do festival que foi criado pelo jornalista Ricard Robles ao lado dos músicos e artistas visuais Enric Palau e Sergio Caballero em 1994 para um público inicial de 6.000 mil pessoas. Nos dez anos seguintes, o público chegou à casa das 80 mil pessoas e atingiu seu recorde na comemoração de 20 anos de Sónar, em 2013, quando 121 mil pessoas se espalharam por sua programação, dividida em três datas de Sónar Dia (quinta, sexta e sábado) e duas de Sónar Noite (sexta e sábado). Isso sem contar a área profissional, que ao longo dos anos se transformou no Sónar + D, que compreende workshops, painéis e uma feira absurda reunindo tendências de novidades das áreas da música e tecnologia vindas do mundo todo.

As campanhas de divulgação do Sónar sempre foram marcadas por imagens emblemáticas, como vemos neste pot-pourri dos 25 anos do festival

Apoiado pelo evento principal em Barcelona, o Sónar se espalhou em showcases pelo mundo. No Brasil, por exemplo, foram três edições, em São Paulo (2004, 2012 e 2013). No geral, já foram 47 eventos espalhados por 27 cidades nos quatro cantos do planeta.

Pela história, pelo peso desses 25 anos e pela programação especialmente bem cuidada e pensada para esta edição de 2018 é que embarco para mais um Sónar. Entre os nomes que estão anotados na minha lista com um #imperdível estão desde os mais pops Gorillaz, Diplo, Black Coffee, Thom Yorke, Bonobo e LCD Soundsystem até sons bem fresh como SOPHIE, Laurel Halo, Helena Hauff, IAMDDB e TOKiMONSTA, até clássicos, como Laurent Garnier, Miss Kittin, DJ Harvey, John Talabolt (num set de seis horas, afe <3), a experiência imersiva de disco music Despacio, de James Murphy e 2 Many DJs, além do master encontro de titãs da música experimental Ryuichi Sakamoto & Alva Noto.

A americana TOKiMONSTA é uma das artistas mais interessantes do line-up do Sónar 2018

Isso tudo sem contar com os eventos off Sónar, que transformam Barcelona na capital da música boa (sim!) nesse período. Então, Michael Douglas, acho que tudo o que eu não vou fazer é dormir nesses próximos dias. Vem, Sónar 2018 <3

Toma aí a playlist do Sónar 2018 pra você entrar no clima

Ainda restam ingressos no site do festival, vai que você anima 🙂

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Sobre a autora

Claudia Assef é uma das mais respeitadas especialistas em música do país. É publisher do site “Music Non Stop” e ao lado de Monique Dardenne fundou o “Women's Music Event”, plataforma de conteúdo e eventos que visa aumentar o protagonismo da mulher na indústria da música.

Sobre o blog

Um espaço para falar sobre descobertas musicais, novidades, velharias revisitadas, tendências e o que está rolando na música urbana contemporânea, seja na noite ou nas plataformas de streaming mais próximas de você.

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